Mensagem inspirada na música “Vozes que Não Contam” – do álbum Desligados do Mapa
Na arquitetura esquecida dos bairros periféricos, entre os vãos dos prédios cinzentos e os grafitis rasgados pela chuva, há vozes. Vozes que não aparecem em jornais, que não seguram microfones, que não têm assento em parlamento nenhum — mas que existem. Gritam em silêncio. São os ecos de histórias jamais colhidas, de dores que não encontram escuta, de vidas que se desenrolam nos bastidores da sociedade dita civilizada.
“Vozes que Não Contam” é um tributo a todos os que foram calados sem algemas. Aos que aprenderam a esconder o choro para não parecerem fracos. Aos que viraram estatísticas antes de virarem adultos. Aos que carregam no peito cicatrizes que o Estado nunca reconheceu. É também uma chamada de atenção, um espelho empurrado à força na cara de um país que se finge cego perante os seus próprios fantasmas.
Cada verso desta música foi escrito como quem recolhe testemunhos de rua – fragmentos de vidas que se cruzam nas paragens de autocarro, nos corredores das escolas sem verbas, nos bares improvisados entre barracões, nos olhares baços de quem perdeu a fé mas ainda caminha. Esta canção é uma espécie de arquivo emocional, onde cada linha é uma voz soterrada sob o ruído de uma cidade que finge não ouvir.
Mas elas estão lá. Sempre estiveram.
No barulho de uma porta a fechar porque o despejo chegou.
No som de uma panela a ferver com o pouco que há.
Na gargalhada forçada de quem tenta esquecer que está desempregado há anos.
Nos passos apressados da mãe que leva os filhos à escola e depois corre para o subemprego.
Na batida forte que vem do quarto do adolescente que escreve rimas para não enlouquecer.
Estas vozes talvez não contem para quem distribui poder ou recursos, mas contam – e muito – para quem ainda insiste em resistir. E enquanto houver arte, haverá forma de amplificá-las.
Este álbum, Desligados do Mapa, não é um protesto vazio. É um manifesto vivo. É sobre dar corpo e volume a essas vozes que não contam, mas que carregam o peso do país inteiro.
E se tu estás a ler isto e sentes que a tua voz nunca foi ouvida: esta canção é para ti.
Tu és a batida que ainda pulsa.
Tu és o som que não se cala.
Tu és parte do coro que vai acabar por ser escutado.
Porque cada palavra não dita também é uma forma de resistência.
E hoje, elas vão ecoar.
Hoje, nós ouvimos.
Vozes que Não Contam - Lourenço Verissimmo











